Arte tem histórico de ser manifesto político

por Marina Prata
Arte tem histórico de ser manifesto político

As eleições de 2018 serviram de estímulo para manifestos não só nas ruas, mas também para a arte do país. Entenda um pouco mais sobre os manifestos artísticos ao longo da história e sobre a Lei Rouanet

Por: Andrey Ribeiro, Mariana Castilho e Marina Prata

O ator e músico Igor Kierke é vocalista e compositor da banda Imperador Sem Teto, formada por estudantes da Escola de Comunicação e Artes da PUCPR. O grupo produz sua arte baseada no contexto político e social do Brasil, e defende o posicionamento político dentro do viés artístico.

Neste ano, o posicionamento político de artistas ganha evidência por conta do cenário eleitoral, embora a classe artística já tenham exercido importantes papéis de liderança em outros momentos decisivos do país. Conheça alguns dos principais:

Diretas Já (1984)

Um dos maiores movimentos da história do país, as Diretas Já buscaram reaver as eleições diretas para a Presidência da República, após as mesmas terem sido revogadas durante a Ditadura Militar. Entre 1983 e 1984, foram promovidas passeatas que somaram cerca de 2,8 milhões de manifestantes em todo o Brasil. Artistas como Christiane Torloni, Fafá de Belém, Chico Buarque, Martinho da Vila, Milton Nascimento e Fernanda Montenegro estiveram presentes nos comícios e mobilizaram a população a favor da Emenda Dante de Oliveira – que acabou sendo rejeitada pelo Congresso. Como símbolos do movimento, destacam-se as músicas “Menestrel das Alagoas” de Fafá de Belém e “Coração de Estudante” de Milton Nascimento, que eram entoadas pelos manifestantes durante as passeatas.

Primavera Árabe (2011)

Chama-se de “Primavera Árabe” a onda de protestos e revoluções instalada em países do Oriente Médio e África a partir de 2011, na busca pela democracia e melhores condições de vida. O movimento predominantemente estudantil teve início na Tunísia, e derrubou ditaduras no Iêmen, Líbia, Marrocos, Jordânia, entre outros. As redes sociais foram o principal meio de divulgação dos ideais da revolta, bem como da arte política relacionada. Destacam-se o videomaker Ahmad Sherif e a blogueira Aliaa Magda, responsáveis por disseminar o trabalho ativista na internet, e o grupo Sit ah-hita (“mulheres das paredes” em árabe egípcio), formado por sessenta grafiteiras do Egito que pintavam sobre feminismo. Manifestações ligadas ao movimento da Primavera Árabe continuam acontecendo em alguns países.

Ativismo nas redes sociais

O ciberativismo, que utiliza a internet para engajar usuários em causas e discussões, existe desde a década de 1990. Um dos formatos mais comuns nas redes hoje é o chamado hashtivism (ativismo através de hashtags), que se popularizou após os hiperlinks serem apropriados como ferramenta pelo Twitter. No Brasil, o hashtivism exerceu um papel importante pela primeira vez com a #VemPraRua, que foi utilizada como instrumento de mobilização durante as Jornadas de Junho, em 2013. Desde então, a internet e as redes sociais tornaram-se um dos principais veículos para campanhas engajadas e disseminação de ideais políticos e socioculturais. Existem exemplos nacionais e mundiais nas mais diversas áreas da sociedade:

#LoveWins: A hashtag (traduzida para “o amor vence”) foi lançada em 2015, após a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo nos Estados Unidos. Mais de 26 milhões de usuários do Facebook adotaram a foto de perfil colorida com a bandeira da causa após o lançamento da campanha. Artistas como Anitta, Maria Gadú, Miley Cyrus, Lady Gaga, Neil Patrick Harris e Ricky Martin comemoraram a decisão da Suprema Corte dos EUA através de suas redes sociais, e reforçaram seus posicionamentos favoráveis ao movimento.

#MeToo: Popularizada no Brasil como “#EuTambém”, a campanha feminista começou no Twitter após denúncias de estupro e assédio sexual contra o produtor Hollywoodiano Harvey Weinstein. A hashtag desencadeou uma série de discussões na indústria e deu oportunidade para mais de 500 mil mulheres falarem sobre seus casos de abuso. Nomes conhecidos como Angelina Jolie, Gwyneth Paltrow, Kaya Scodelario, Reese Witherspoon e Jennifer Lawrence também aderiram à campanha, que resultou no protesto de atrizes durante o Globo de Ouro de 2018 e na criação da organização Time’s Up – plataforma de ajuda a vítimas de assédio.

#SomosTodosMaju: Em 2015, a jornalista Maria Júlia Coutinho, apresentadora do tempo no Jornal Nacional, recebeu comentários racistas através das redes sociais pessoais e oficiais do programa. Em uma publicação na página do telejornal, foram feitos mais de 7 mil comentários que caracterizavam injúria racial. Em resposta, colegas jornalistas, internautas e artistas como Thiaguinho, Rafael Zulu, Fernanda Souza e Luiza Possi saíram em defesa da apresentadora, subindo a #SomosTodosMaju, que ficou em primeiro lugar nos trending topics do Twitter brasileiro.

#TodosPelaAmazônia: O governo federal decretou, no ano passado, a extinção da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), cedendo uma área de 5 milhões de hectares da Floresta Amazônica à exploração mineral. A modelo brasileira Gisele Bündchen foi a primeira personalidade a se pronunciar nas redes sociais contra o decreto, seguida pelos artistas Ivete Sangalo, Elba Ramalho, Cauã Reymond e Marina Ruy Barbosa. Em um ato no Congresso que pedia a revogação da decisão governamental, estavam presentes Christiane Torloni, Susana Vieira, Maria Gadú e Tico Santa Cruz. Em um vídeo oficial da campanha 345Amazônia, Caetano Veloso, Mariana Ximenes, Murilo Rosa e Dira Paes fizeram críticas ao governo de Michel Temer e relembraram o desastre de mineração em Mariana, no mesmo ano. Como resultado, o decreto foi revogado em setembro de 2017.

Um pouco sobre a Lei Rouanet

Alguns artistas que tomaram partido diante das recentes discussões políticas foram criticados por fãs e seguidores, acusados de ocultar interesses em suas posições. Por uma interpretação falha, criou-se um estigma ao redor da chamada Lei Rouanet, que seria um suposto benefício concedido pelo governo à classe artística. O Portal Comunicare conversou com a professora do curso de Teatro da PUCPR Laura Haddad, que esclareceu alguns equívocos sobre o projeto do governo federal.

Arte: Andrey Ribeiro

Este conteúdo faz parte de uma reportagem sobre o tema publicada na edição #314 do jornal impresso Comunicare. Confira, abaixo, a edição digitalizada do jornal.

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