Brasil atinge recorde no número de solicitações de refugiados

Paraná cadastrou mais de 300 solicitações de entrada de imigrantes nos últimos três meses e pode atingir recorde em 2018
Por Paula Moran e Thaís Mota
A entrada de imigrantes refugiados de países em situações de guerra ou crises políticas disparou no ano de 2017 no Brasil. Foram 33.865 solicitações de refúgio em todo o país no ano passado, um aumento de 228% comparado aos números de 2016, de acordo com dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), divulgados pelo Ministério da Justiça.
Em Curitiba, o Centro Estadual de Informação para os Migrantes, Refugiados e Apátridas do Estado do Paraná (Ceim), cadastrou, desde o dia 17 de outubro de 2017 até o final de janeiro deste ano, a entrada de 294 imigrantes em um período de 106 dias. O número representa 32% de todos os cadastros realizados desde 2016 no órgão da Secretaria de Estado da Justiça, Trabalho e Direitos Humanos (SEJU).
O número de atendimentos realizados pelo Ceim também aumentou, o centro contabilizou cerca de 3.332 serviços até o dia 27 deste mês. O instituto, que também dá orientação acerca da regularização de documentos, direitos fundamentais, legislação do trabalho e acesso à outros serviços e benefícios do programa de Assistência Social, prevê que 2018 seja o ano recorde de cadastros de novos imigrantes e refugiados no Paraná.
A diretora do Departamento de Direitos Humanos e Cidadania da Secretaria de Estado da Justiça, Trabalho e Direitos Humanos (SEJU), Regina Bley, comenta que o aumento nos cadastros, além dos fatores de problemas nos próprios países, também se deve a muitos imigrantes que atraem mais refugiados, como é o caso dos haitianos. “A própria referência de pessoas conhecidas, amigos e familiares, que já estão aqui instalados, vai atraindo outras pessoas, e também os dados que são divulgados de aumento de vagas de trabalho são motivos para o aumento”, afirma.
O centro é um espaço de informação e orientação, de acordo com Regina: “Prestamos atendimento com relação a regularização documental, o que eles precisam fazer, quais caminhos precisam recorrer, que tipo de documentos eles têm que ter aqui para estarem em uma situação regular”. Há também, no caso dos migrantes, um atendimento específico em conjunto com a Agência do Trabalhador, no qual é feito o encaminhamento para vagas de trabalho.
Para o sociólogo Cezar Bueno, especialista em conflitos contemporâneos e políticas públicas relacionadas a direitos humanos, o país se tornou ainda mais atrativo para refugiados pela questão territorial, como é o caso da Venezuela, que faz fronteira com o Brasil. “Hoje, o que a gente vê é uma forte imigração por conta da divisão territorial, não é mais tanto pelo apelo econômico na busca de emprego. Mas mesmo assim, o Brasil continua sendo um país de preferência para muitos imigrantes, talvez, também, pela língua portuguesa que é o idioma de muitos países africanos, por exemplo”, conta.
Bueno diz que apesar de o Brasil ser um país ter uma proximidade cultural em razão de estar na América Latina, há outras questões muito sérias que dificultam a entrada desses imigrantes: “Não há políticas públicas capazes de oferecer o mínimo do exercício da cidadania a eles. O país acolhe do ponto de vista legal e jurídico, ele aceita, tem uma facilidade para trazer pessoas em situações de países que têm sofrido com catástrofes naturais e guerras, mas o problema maior é a falta de políticas públicas”.
Ele afirma que é preciso oferecer a esses refugiados, um conjunto de políticas públicas capazes de promoverem o direito do exercício de uma cidadania digna, e não apenas acolher documental ou juridicamente.
Dificuldade na adaptação faz com que refugiados optem pelo empreendedorismo
O engenheiro de computação Wael Al Zaeim, da Síria, afirma que uma das maiores dificuldades na vinda para o Brasil foi aprender o idioma. “Fiquei três meses sem sair de casa porque não entendia nada”, conta. A escolha de abrir um restaurante pareceu mais fácil por não encontrar oportunidades de emprego em sua área, já que o português era sempre exigido.
Zaeim está no Brasil desde 2015, e escolheu Curitiba pelo fato de ser uma cidade pequena, e portanto, mais fácil de se adaptar. Ele também admira a aceitação dos brasileiros para com os imigrantes: “Escolhi o Brasil porque é um dos únicos países que estão aceitando o passaporte sírio, e o mais legal, é que os brasileiros são muito gentis e aceitam muito bem os estrangeiros”.
O engenheiro também diz que nunca foi alvo de preconceitos devido à sua naturalidade árabe, e vê isso como um fator determinante em sua adaptação ao migrar para o país, que mesmo com as dificuldades do idioma, foi muito receptivo.
CASLA promove participação cidadã na questão dos refugiados
A Casa Latino-Americana (CASLA) é referência no auxílio a refugiados e imigrantes em Curitiba. Essa instituição tem como principal suporte a assessoria jurídica, que vai em busca dos direitos dos imigrantes e atua garantindo o processo de regularização de documentos e inserção na sociedade.
Além disso, a entidade é conveniada com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e escolas municipais, que contam com professores voluntários ensinando a língua portuguesa. Cursos de inserção no Brasil e profissionalizantes também são oferecidos, em colaboração com o Ministério Público do Trabalho.
Conheça o espaço da Casa Latino-Americana
De acordo com a Vice-Presidente da CASLA, Ivete Maria Caribé da Rocha, são atendidos, em média, de 20 a 30 migrantes e refugiados por semana, sendo esses mais comuns de países como o Haiti, Nigéria, Guinea-Bissau, Guinea Conakry e Congo. “A grande maioria dos países da África vêm para o Brasil por conflitos internos provocados por problemas políticos, perseguição política e religiosa, que são insuflados por grupos econômicos”, explica Ivete.
Para ela, a atual situação dos refugiados no Brasil é complicada, pois não há suporte para essas pessoas que, quando chegam no país de refúgio, passam por grandes dificuldades. “Eles chegam na Polícia Federal para verificar a documentação, mas não sabem preencher o formulário, que é extenso, complicado e tem perguntas repetitivas. Como esses migrantes não falam a língua portuguesa, eles indicam para nós, porque temos uma equipe de advogados voluntários que fazem essa documentação para que se consiga o protocolo de refúgio, que é provisório”.
A dificuldade, em termos de documentação, segundo Ivete, é a reunião familiar. Muitos dos que pediram refúgio deixaram marido, esposa e filhos em seu país de origem e o processo para conseguir trazer esses familiares é demorado, complicado e incerto.
Como a CASLA é uma ONG sem fins lucrativos e não conta com nenhuma ajuda do governo, tudo se mantém através da ajuda dos voluntários, de campanhas de doação e pela luta por projetos que, se forem aprovados, recebem uma verba dedicada à problemática dos migrantes e refugiados.
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