Mulheres pretas redefinem o padrão de Curitiba ao aceitarem seus cabelos

por Gabriela Amorim
Mulheres pretas redefinem o padrão de Curitiba ao aceitarem seus cabelos

Embaixadora da Academia de Cabelos Crespos e Cacheados e cabeleireira especializada incentivam movimento de valorização das raízes africanas na capital paranaense 

Por Gabriela Amorim | Foto: Gabriela Amorim

A primeira Academia de Cabelos Crespos e Cacheados de Curitiba completará, em maio, um ano de formação. Fundada pela profissional Milania Santana, o espaço tem como objetivo resgatar a autenticidade da comunidade preta, a fim de promover a resistência e o empoderamento por meio da valorização das raízes culturais.

Além de oferecer cursos, workshops e atendimentos personalizados voltados para a educação  dos cabelos naturais, o salão também se tornou um espaço de empoderamento para quem deseja se libertar de padrões estéticos que historicamente marginalizam as texturas naturais.

Segundo dados do Google Trends, as buscas por cabelos cacheados e crespos dobraram desde 2017. Foi nesse ano que, pela primeira vez, o interesse por esses tipos de cabelo superou o de cabelos lisos, registrando um aumento de 232% e 309%, respectivamente. No Paraná, a tendência também se refletiu: nos últimos cinco anos, as buscas por cabelos cacheados marcaram 83%, enquanto as de cabelos lisos chegaram a 17%. 

Em Curitiba, dados do Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que 24% da população se autodeclara preta ou parda. Em contrapartida, a falta de salões especializados fazia com que muitas dessas pessoas precisassem se deslocar para cidades metropolitanas em busca de atendimento adequado para seus cabelos com curvatura e volume. 

Assim, com a necessidade do serviço, estabelecimentos voltados para cabelos crespos e cacheados começaram a surgir na cidade, impulsionados pela valorização da estética natural. Foi nesse cenário que Milania decidiu abrir sua academia e oferecer um atendimento acessível para essa parcela da população.

Milania é cabeleireira e experiente em cabelos crespos há mais de 10 anos. Sua dedicação a essa área surgiu da vontade de proporcionar um atendimento que compreendesse as particularidades de cada pessoa.

Por muito tempo, a indústria da beleza priorizou padrões eurocêntricos. Isso fez com que muitas pessoas recorressem a alisamentos ou tivessem dificuldade em encontrar um atendimento adequado e produtos apropriados.

Com experiência em transição capilar, a profissional revela que foram suas próprias clientes que a inspiraram a embarcar nesse processo. Até então, ela ainda não havia aceitado completamente seu cabelo natural.

Por acompanhar a jornada delas, decidiu reconectar-se com suas raízes. “Foi por meio dessa coragem das minhas clientes que percebi que, para verdadeiramente ajudar os outros a se aceitarem, eu também precisava me aceitar primeiro”, conta.

A estudante Larissa Fernandes procurou a cabeleireira devido à dificuldade de lidar com seus cachos. O interesse em entender melhor a formação da curvatura do cabelo e descobrir os tratamentos mais indicados melhorou sua própria relação. “Procurar o lugar certo me fez perceber que eu não precisava esconder meu cabelo, mas sim aprender a cuidar dele.”

A cabeleireira Stephanie Brito, especializada em curvaturas, trabalha há três anos na área. Assim como Milania, ela passou por um processo de transição capilar em 2017, que transformou sua relação com a sua identidade. “O processo de transição capilar não foi fácil, principalmente por eu ter passado no meio da gravidez. Durante muito tempo, lutei contra a minha essência, pensando que meu cabelo não era bonito ou adequado para certos ambientes”, diz.

Foi essa mudança de perspectiva, junto à observação do trabalho dos profissionais no salão em que era cliente, que a fez se interessar pela área. Ela passou a se questionar sobre as lacunas no mercado e a importância de profissionais qualificados para atender essa demanda.

Stephanie também ressalta que, atualmente, apesar do número de mulheres que aceitam seus fios naturais ter crescido, a química de alisamento ainda predomina no padrão estético de Curitiba. Ter cabelos ondulados, cacheados ou crespos na cidade muitas vezes é visto como um ato de rebeldia ou até mesmo revolucionário.

Hoje, ela compartilha sua experiência com outras pessoas, principalmente em Curitiba. Oferece consultoria e orientação para quem deseja cuidar dos cachos ou passar pela transição capilar, e aborda temas como hidratação, finalização e autoestima.

Ao encontrarem esses lugares, as mulheres se sentem mais seguras para abraçar e cuidar da sua identidade capilar.

Confira como funciona o processo de transição capilar

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