Municípios com média de dois mil habitantes do Paraná mostram mais eficiência com menos recursos na educação

por Lara Wilsek
Municípios com média de dois mil habitantes do Paraná mostram mais eficiência com menos recursos na educação

Curitiba investe 900 vezes mais que Paranapoema por ponto do Ideb, mas tem resultado igual ou inferior

Por: Lara Wilsek, Letícia Seixas, Maria Júlia Neves e Maria Luiza Baiense

Foto: Banco de imagem Pexels

Um levantamento exclusivo para esta reportagem, com base em dados do Gov.br sobre repasses à educação pública dos 399 municípios do Paraná, revela uma contradição que pode colocar em perspectiva a lógica tradicional do investimento público: mais dinheiro não garante melhor desempenho educacional. Segundo o portal da transparência, o estado destinou R$678.245.972,91 à educação municipal, valor que inclui gastos com infraestrutura escolar, salários de professores, materiais didáticos e programas de apoio pedagógico. No entanto, municípios que recebem mais recursos nem sempre apresentam os melhores resultados em avaliações do Ideb.

A análise compara os cinco municípios que mais receberam recursos para a educação pública (Curitiba, Cascavel, Ponta Grossa, Maringá e Foz do Iguaçu) com os cinco que menos receberam (Paranapoema, Flórida, Jardim Olinda, Santa Inês e Ivatuba), destacando números de escolas, população, média do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e investimento, segundo dados do portal da transparência do Governo do Paraná. 

O Ideb é um indicador criado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão vinculado ao Ministério da Educação, com o objetivo de medir a qualidade do ensino nas escolas públicas brasileiras. Ele é calculado a partir de dois componentes principais: o desempenho dos alunos em avaliações padronizadas de Língua Portuguesa e Matemática, aplicadas pelo Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), e a taxa de aprovação escolar, que reflete o fluxo dos estudantes ao longo das séries. Dessa forma, o índice combina aprendizagem e rendimento escolar em um único número, permitindo comparações ao longo do tempo e entre diferentes redes de ensino, municípios e estados. O dado é divulgado a cada dois anos e serve como referência para o planejamento de políticas públicas na área da educação.

Curitiba, capital e cidade mais populosa do estado, recebeu mais de R$ 70 milhões, com uma rede composta por 439 escolas, incluindo  CMEIs (Centros Municipais de Educação Infantil) e CMAEEs (Centros Municipais de Atendimento Educacional Especializado), representada por uma população de 1,77 milhão de habitantes. Apesar do volume robusto de recursos, sua média do Ideb é de 5,85.

Em contraste, Ponta Grossa, que recebeu menos da metade desse valor (R$ 22,8 milhões), também registra Ideb de 5,85, obtendo exatamente o mesmo desempenho. Foz do Iguaçu, com o menor investimento entre os grandes (R$ 14,5 milhões), alcança o melhor Ideb entre os cinco, 6,5. O doutor em educação e professor da rede pública Rui Valese aponta que o problema está na má gestão. Segundo ele, muitas vezes os investimentos são direcionados para áreas que não são prioritárias, deixando de atender demandas essenciais da educação. Além disso, há casos de desvio de finalidade, quando os recursos destinados à educação são usados para cobrir déficits de outras áreas do município, e até situações de corrupção, como obras superfaturadas.

Considerando esse cenário, os pequenos municípios com média de 2 mil habitantes, com apenas uma ou três escolas, se destacam pela eficiência nos resultados. Paranapoema, por exemplo, recebeu apenas R$77 mil em repasses e obteve um Ideb de 6,12, superando inclusive a capital.

Outros casos semelhantes são Ivatuba, Santa Inês e Flórida, que registram Idebs entre 5,9 e 6,0, rivalizando com grandes centros urbanos, mas com um custo significativamente menor por escola, habitante e ponto no indicador. Assim, entre os menores municípios analisados, o desempenho educacional chama a atenção de forma surpreendente.

Apesar da forte correlação entre número de escolas e valor recebido, os dados demonstram que investimento elevado não se traduz automaticamente em melhor qualidade educacional. O custo por habitante e por escola nos pequenos municípios é significativamente mais baixo, mas o resultado educacional não acompanha essa diferença.

Para Valese, existem dois problemas com a distribuição de recursos públicos para a educação entre os municípios paranaenses. O primeiro sobre a gestão dos recursos, no qual ele aponta que o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE) detectou irregularidade em quase um terço dos municípios, como a realização de atividades que não são relacionadas ao setor de educação. O outro seria a falta de investimento em mais recursos em municípios onde mais é necessário “Com uma visão equivocada de meritocracia, acabando ’punindo’ aqueles municípios que não têm bons índices em educação. Porém, o volume não é necessariamente um problema, mas o não atendimento de pontos que são fundamentais para uma verdadeira valorização da educação: salas de aula e escolas adequadas, condições de trabalho decente para professores e demais funcionários das escolas, valorização profissional via salário digno, formação continuada, gestão democrática e liberdade de cátedra”, completa.

O professor ressalta que os dados revelam uma lição importante: a educação, assim como a saúde pública, historicamente nunca ocupou um lugar de real prioridade nas esferas municipal, estadual ou federal. Para ele, enquanto essas áreas continuarem sendo negligenciadas, será impossível construir uma sociedade democrática e igualitária no Brasil. Além disso, a ausência de investimentos consistentes em educação compromete diretamente o desenvolvimento do país. Parte dessa responsabilidade, segundo Valese, também recai sobre a própria sociedade, que tem sido facilmente convencida a apoiar agendas focadas em segurança pública e questões morais, em detrimento de políticas estruturantes. Ele defende que, ao priorizar a educação, o país tende a formar profissionais mais qualificados, o que se traduz em maior produtividade, melhores empregos, crescimento do PIB e melhoria na qualidade de vida da população.

Esta reportagem foi desenvolvida na disciplina de Jornalismo Investigativo do curso de Jornalismo da PUCPR. Confira outras investigações no link: www.portalcomunicare.com.br/jornalismo-investigativo



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