Grêmios das estaduais se mobilizam em ações contra o Novo Ensino Médio

por Gabrielle Tiepolo da Luz
Grêmios das estaduais se mobilizam em ações contra o Novo Ensino Médio

Aumento da desigualdade educacional causada pela mudança do sistema de ensino do ensino médio vem preocupando grêmios estudantis de Curitiba, que pedem por mudanças

Por Gabrielle Tiepolo da Luz | Foto: Gabrielle Tiepolo da Luz

Estudantes foram às ruas em diversas cidades do país para protestar contra o “novo” ensino médio, que foi implantado a partir de 2022. A proposta tinha como objetivo dar autonomia para que o estudante escolhesse as áreas de aprofundamento para seus estudos, deixando a grade mais flexível. Em contrapartida, esse novo sistema traz uma carga horária mais pesada e uma falta de padronização entre as instituições, que desagrada os estudantes.

Para representantes do grêmio estudantil do Colégio Estadual do Paraná (CEP), os maiores impactados com essas decisões são os alunos de escolas públicas, pois o investimento é precário e o dinheiro vem sendo direcionado para empresas privadas. “Eles investem em tecnologias, como as do Google, sendo que a maioria das escolas mal tem internet”, diz Lorena Fontalvo, de 17 anos e vice-presidente do grêmio. Ela ressalta também a existência de famílias que não têm televisão em casa e, portanto, não faz sentido que o ensino seja voltado para a tecnologia.

A proposta de dar mais liberdade ao estudante, vendida como o ponto principal desta mudança, tem encontrado desafios durante a implantação. A começar pela falta de investimento. Na mesma época em que o ex-presidente Michel Temer sancionou a mudança do ensino médio, ele também bloqueou os investimentos para a educação em 20 anos. As duas sanções conjuntas levaram ao ato da primavera secundarista, em 2016.

Dificuldades das escolas

As escolas têm encontrado dificuldades para manter a qualidade do ensino e seguir na proposta. Isso devido ao orçamento de cada instituição, que tem novos gastos gerados pela necessidade de um corpo docente maior para abranger as novas opções de escolhas.

“Boa parte do investimento foi direcionado aos materiais de algumas matérias, mas algo que chocou alguns alunos foi a falta de livros didáticos em várias matérias, atualmente temos somente os livros de Português e Matemática”, afirmou Felipe Bossoni, de 17 anos e presidente do grêmio estudantil do Colégio Estadual Dom Orione. 

Para os alunos, falta preparo dos professores, pois com a nova lei o profissional não tem a obrigatoriedade de ter uma formação para lecionar e isso vem prejudicando a formação dos estudantes. “Também foi pecado para a capacitação dos professores, com muitos de educação física, por exemplo, assumindo aulas de projeto de vida”, complementa Felipe.

Além dos problemas de corpo docente e material didático, os diretórios estudantis denunciam problemas com os novos itinerários. “Alguns estudantes estão aflitos devido aos itinerários, pois por algum motivo desconhecido, alunos foram colocados em itinerários onde não escolheram estar”, ressalta o presidente do Grêmio estudantil do Colégio Estadual Dom Orione, e adiciona que não é um problema local e que estudantes de outras escolas também relataram o mesmo problema. Ana Beatriz de Oliveira, participante do grêmio do Colégio Professor Lysímaco Ferreira da Costa, adiciona a forma bruta como os itinerários foram aplicados: “Foi sem muita explicação, eles só chegaram, apresentaram os nomes e falaram pra gente escolher.”

A desigualdade é o maior problema

“Antipopular, autoritária, precarizante, privatizante, antidemocrática, desigual, sem qualidade.” Essas são algumas das características que a APP sindicato utiliza, em nota oficial, para definir o NEM, Novo Ensino Médio. 

Assim como os alunos, professores também apresentam revolta a respeito do projeto e da forma como ele foi implantado. “Entendemos que as portarias publicadas pelo MEC nesta semana não contemplam os anseios da classe trabalhadora e dos estudantes da escola pública”, afirmou o sindicato, em nota oficial, sobre a mudança da base nacional comum curricular (portaria nº 397) e o estabelecimento de uma Consulta Pública para “reformar a Reforma” (portaria nº 399).

Os estudantes dos grêmios demonstram conhecimento das diferenças existentes na aplicação do ensino e de como as dificuldades são maiores para colégios públicos em relação ao setor privado. “A desigualdade começa quando para eles o empreendedorismo é abrir uma startup e pra gente é vender bolo no pote”, comenta a vice-presidente do grêmio estudantil do CEP. Os alunos comentam, também, que o sistema não encoraja o pensamento crítico. “O novo ensino médio está formando um aluno que não pensa sobre o mundo, não questiona. Ele não te estimula a crescer, não te estimula a pensar”, observou Lorena

Professores e alunos demandam mudança

Educadores e estudantes, por meio de sindicatos e grêmios, afirmam que esse modelo de ensino não funciona e pedem por novas modificações. Estudantes comentam que o antigo modelo não era perfeito, mas era melhor que o atual. “Deve-se arrumar esse novo método de ensino onde os alunos sejam os protagonistas do projeto, e, também, haver uma implementação ao ensino fundamental onde pode haver um aproveitamento maior”, afirma Felipe, complementando a nota da APP que ressalta que o ensino deve ser voltado para estudantes serem protagonistas dos próprios projetos. 

[box type=”info”] Conheça os itinerários do Novo Ensino Médio

Conheça as categorias das disciplinas que o aluno pode escolher para se aprofundar

  • Ciências da natureza e suas tecnologias;
  • Linguagens e suas tecnologias; 
  • Ciências humanas e sociais aplicadas;
  • Matemática e suas tecnologias; 

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O que foi a Primavera secundarista

Evento que mobilizou estudantes de diversas cidades do estado, em 2016, liderados por estudantes de 15 a 18 anos foi responsável por mudanças no cenário da educação

A Primavera Secundarista de 2016 foi um movimento estudantil que surgiu, em São Paulo, mas logo se espalhou para outras cidades do país, em resposta à proposta da reforma do ensino médio e bloqueio dos investimentos para a educação, sancionadas pelo governo de Michel temer em 2016, estudantes criaram uma onda de protestos e ocupações nas escolas. 

A reorganização escolar tinha a ideia de agrupar escolas por ciclos de ensino e fechar as que tivessem baixa demanda, medida que foi recebida com críticas por parte dos estudantes, professores e comunidade escolar, que argumentam que o fechamento de escolas prejudicaria o acesso à educação e a qualidade do ensino. Juntamente com a reforma do ensino médio, proposta sem a consulta de estudantes e professores, e o bloqueio dos investimentos, essas ações geraram revolta na comunidade estudantil, que exigiam melhorias.

Oficialmente, no fim de novembro de 2016, em decorrência da não revogação do Novo Ensino Médio, os estudantes decidiram ocupar as escolas e as ruas em forma de protesto exigindo uma mudança na política educacional. As ocupações duraram cerca de três meses e contaram com a participação de milhares de estudantes de escolas estaduais, sendo, em média, 800 instituições somente no Paraná.

Impactos do movimento

Atualmente, podemos observar os impactos desse movimento nos movimentos estudantil atuais. A frente estudantil contra o Novo Ensino Médio vem distribuindo panfletos por Curitiba pedindo a revogação do novo sistema, nessas notas eles citam “Devemos nos inspirar no exemplo das mais de mil escolas e universidades ocupadas em todo o Brasil nos anos de 2015 e 2016, que sacudiu o país barrando naquele momento uma série de medidas que visavam o fechamento de várias escolas.”. A Primavera Secundarista foi um marco na história da educação brasileira e representou uma vitória dos estudantes na luta por seus direitos. Além de conseguir a suspensão da reorganização escolar, o movimento também gerou debates sobre a qualidade do ensino público, a valorização dos professores e a participação dos estudantes na gestão escolar.