Jogadoras de futebol americano financiam viagens para competições

por Mariana Machado de Almeida
Jogadoras de futebol americano financiam viagens para competições

Times curitibanos também não recebem qualquer ajuda municipal e sobrevivem apenas com as mensalidades que atletas pagam

Por Mariana Machado de Almeida | Foto: Thaissa Pozzo

A falta de investimentos e incentivos vem prejudicando as equipes femininas de futebol americano em Curitiba. Por conta da ausência de interesse governamental, as atletas precisam destinar seus próprios recursos para financiar viagens de jogos e treinos. Para uma viagem estadual, por exemplo, uma atleta gasta em torno de  R$ 500 a R$ 550. 

Em Curitiba, os times de futebol americano feminino sobrevivem com as mensalidades que as atletas pagam, o valor gira em torno de R$ 45. Além desse dinheiro, algumas marcas prestam auxílio gratuito aos times, emprestando equipamentos de fisioterapia e fornecendo os uniformes. Os treinos são feitos em praças com gramados em boas condições para evitar lesões. Os times curitibanos Cold Killers e Silverhawks treinam atualmente no parque São José, na praça Dom Geraldo Fernandes e no Parque Barigui. 

Quando o time tem partidas marcadas, o anúncio é feito via redes sociais, mas não há um grande alcance de público. Por não ter tanta visibilidade, geralmente quem assiste às competições são as pessoas que já estão inseridas no meio do esporte. Os jogos acontecem nos estádios dos times masculinos de futebol americano. O preço dos ingressos varia, normalmente custando R$ 20. Os times masculinos de futebol americano, diferentemente dos times femininos, recebem um auxílio maior e possuem estádios próprios para jogos e treinos. Então, sempre que as meninas precisam de um lugar para jogar na capital, as equipes masculinas sediam seus estádios. 

No dia 11 de março, a Seleção Brasileira Feminina teve seu primeiro jogo oficial contra os Estados Unidos. A partida ocorreu em São Paulo. Atletas de outros estados precisaram destinar seus investimentos pessoais para pagar passagens de avião e alimentação no estado. Apenas as acomodações e transporte local foram oferecidos pela Confederação Brasileira de Futebol Americano (CBFA). A entidade reitera não receber qualquer ajuda governamental. Trabalha apenas com os parceiros interessados e com dinheiro de inscrições para jogos. 

O time feminino Cold Killers teve quatro atletas escolhidas para participar da seleção brasileira. Caroline Gurgel, uma das selecionadas, conta que precisou fazer uma vaquinha para pagar os custos da viagem de Curitiba para São Paulo. “Conseguimos o dinheiro muito rápido, até pessoas que não conheciam o futebol americano se solidarizaram e puderam ajudar”, afirma. “Sem esse apoio eu com certeza não teria conseguido viajar”. 

Caroline expõe as principais dificuldades, em sua própria opinião, de praticar um esporte que recebe pouco reconhecimento governamental. “A questão principal, fora a falta de ajuda financeira, é o preconceito social que recebemos por sermos mulheres praticando esse esporte. As pessoas enxergam o futebol americano como um esporte bruto que não deveria ser coisa de mulher”. Além dessa questão social, as atletas ainda lidam com o custo necessário para jogar futebol americano. Os equipamentos são caros. Um capacete chega a custar mais de R$ 1000. 

A CBFA afirma que consegue arcar apenas com pequenos custos nos jogos das seleções: acomodações, aluguel de estádios e equipe de arbitragem. Mas além disso, são os próprios atletas que se responsabilizam com o restante dos custos. “Infelizmente a realidade do esporte é essa. A confederação não recebe nenhum subsídio do governo. Todo dinheiro que recebemos é de inscrições em competições que organizamos”, afirma Rodrigo Nascimento, diretor de comunicação da organização. “Não temos patrocinadores nem apoio do governo. Não existe bolsa-atleta para praticantes do futebol americano. A única esperança é conseguirmos patrocinadores.” 

Mesmo com condições ruins para continuar praticando o esporte, o treinador das Cold Killers, Anderson Candioto, persiste. “O que nos move é a paixão pelo sonho das meninas.

 

Atleta Caroline Gurgel conta sua trajetória no esporte

Jogadora da Seleção Brasileira e do time municipal Cold Killers, Carol conta como conheceu o futebol americano e quando começou a praticar 

“Conheci o futebol americano quando meu primo estava vendo um jogo na televisão e comecei a assistir também, mesmo não entendendo nada”. Carol relata que esse foi o primeiro contato que teve com o esporte. Logo após esse dia, com 17 anos, ela começou a jogar futebol de campo, na posição de goleira. Em um treino no parque São José, Gurgel relembra que tinha um time feminino de futebol americano também treinando. “Eram as Cold Killers. Elas me perguntaram se eu conhecia o futebol americano e me convidaram para participar de um treino. Eu fui sem compromisso nenhum e sem entender nada. As meninas me acolheram e me ajudaram a entender o que depois se tornou uma coisa apaixonante na minha vida, mas que começou sendo apenas um hobby”.

Agora com 21 anos e atleta da Seleção Brasileira, Carol relembra como foi entrar para o time nacional. Em 2019, aconteceu a primeira convocação para a seleção. Foi feita uma análise em vídeo dos melhores lances dos jogos das atletas. Gurgel não foi selecionada nessa ocasião, mas esperava conseguir em outra oportunidade. No ano seguinte, a pandemia destruiu qualquer esperança de montar uma seleção e os planos precisaram ser postergados. “Em 2021, fizeram uma nova convocação. Infelizmente por conta do trabalho e estudos, eu não pude participar e o sonho foi adiado mais um vez”. 

No começo deste ano, a CBFA realizou mais uma seleção de atletas. A confederação fez uma análise da temporada passada das jogadoras, estudaram os jogos das equipes e convocaram mais atletas. “Nessa seleção eu finalmente entrei e consegui participar do primeiro jogo do time, em março”. Mas as dificuldades continuaram, Carol relata como foi difícil conseguir o dinheiro necessário para realizar a viagem até São Paulo, onde aconteceu o primeiro jogo da Seleção. “Até uma semana antes da viagem, foi dito para nós que nosso principal custo seria a passagem de avião e que o dinheiro para a alimentação e transportes no local seria fornecido pela CBFA. Mas poucos dias antes de embarcarmos, nos avisaram que precisaríamos arcar com esses custos também. Eu e mais algumas atletas fizemos  vaquinhas online para arrecadar o valor e outras precisaram pedir dinheiro em sinaleiros”. 

“Como meu técnico costuma dizer, o que continua nos movendo é a prevalência da paixão pelo esporte em meio a tantas dificuldades”.